Ele surgiu como figurinha fácil nos grupos de WhatsApp, trilha sonora de risadas apressadas, filtro de sarcasmo pronto. Um vídeo aqui, uma piada ali. Mas Isaac, o homem que viralizou por correr descalço numa prova de rua, não é meme. É espelho.
Sem tênis, sem patrocínio, sem o verniz da vida resolvida. O que ele tem? Cicatrizes. Não as que sangram, mas as que gritam. Aos 14, Isaac já dialogava com os demônios líquidos do álcool e tragava o silêncio da exclusão com o cigarro entre os dedos.
Hoje, vive nas ruas. Isso mesmo!, nas ruas. Onde não há stories com filtro, nem palavras doces no feed. Ali, o asfalto queima. O vento corta. E a solidão tem CPF.
Mas eis que a realidade, essa senhora que não costuma ter paciência com narrativas de autoajuda, resolveu oferecer um instante de respiro. Uma corrida de rua, organizada pela Academia Mundo Fitness, transformou-se em altar improvisado. Sem chuteira ungida, sem medalha prometida. Apenas um homem, sua alma ferida e um sopro de esperança.
“Foi ali que Deus me tocou”, disse Isaac, com uma convicção que não cabe nas entrelinhas da ironia. E talvez tenha sido mesmo. A corrida, mais do que uma disputa de tempo, virou tempo de reencontro. Com algo que há muito parecia morto: a vontade de começar de novo.
Não se trata de romantizar a pobreza. Nem de transformar dependência química em storytelling bonitinho. A questão aqui é outra, é o fato de que, num país onde se pede meritocracia a quem não tem nem documento, ainda há quem corra. Não pela vitória. Mas pela dignidade.
Isaac é um alerta em carne viva. Ele não quer aplausos. Quer chão firme. E se possível, uma chance.
Porque o Brasil que se comove com a história dele precisa decidir se quer rir de Isaac, ou correr com ele.
Carlos Jardel