Opinião: Dom Aloísio Lorscheider: O que pode um nome? - Revista Camocim

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terça-feira, 21 de dezembro de 2021

Opinião: Dom Aloísio Lorscheider: O que pode um nome?


Por Carlo Tursi, no sit da Pastoral Carcerária 


No próximo dia 23 de dezembro fará 14 anos que Dom Aloísio Lorscheider, arcebispo de Fortaleza entre 1973 e 1995, deixou este mundo. O peso de sua liderança no episcopado brasileiro (CNBB) e latino-americano (CELAM), bem como a sua constante intervenção – ora profética, ora mediadora, mas sempre solidária – nas lacerantes questões sociais e políticas daquela época se refletem ainda hoje, entre nós, em diversas instituições públicas (além de religiosas) em nossa capital que orgulhosamente levam seu nome: 


Posto de Saúde Dom Aloísio Lorscheider (Rua Betel, Itaperi), Escola Municipal Dom Aloísio Lorscheider (Rua Júlio Silva, Praia do Futuro), Avenida Dom Aloísio Lorscheider (bairro Vila Velha), Escritório de Direitos Humanos Dom Aloísio Lorscheider (EDHAL) da Câmara Municipal de Fortaleza, etc.


À lista de homenagens será acrescentada em breve mais uma obra pública, atualmente em construção no bairro de Itaperi: o »Parque Dom Aloísio Lorscheider«, instalação cultural e desportiva de 30.000 m², situada na Av. Bernardo Manuel (com Rua Holanda). A solicitação da homenagem partiu do deputado estadual Renato Roseno (PSOL), por meio do projeto de lei 293/20, atendendo a uma sugestão da Pastoral Carcerária do Ceará. Em 20-11-2020 foi ratificada como Lei nº17.335 e publicada no Diário Oficial do Estado [23-11-2020, Série 3, Ano XII, nº 260]. 


A força simbólica do nome, neste caso, é particularmente grande, já que o futuro parque (que está com 40 % das obras concluídos, de acordo com a SOP) ocupará o terreno onde, em passado recente, funcionava o Instituto Penal Professor Olavo Oliveira I (IPPOO I). É conhecida a singular solicitude pastoral de Dom Aloísio para com a população encarcerada, que iniciou ainda nos “anos de chumbo” do regime militar, com destemidas visitas regulares a presos políticos, e foi se estendendo, ao longo dos anos, aos demais detentos, sempre de acordo com o lema evangélico »Eu estive preso, e vocês vieram me ver« (Mateus 25,36). 


Difícil de esquecer é também o tenso episódio do “sequestro” do arcebispo por parte de um grupo de presos em fuga, durante uma visita de toda uma equipe de Pastoral Carcerária no (hoje extinto) Instituto Penal Paulo Sarasate (IPPS), em 15 de março de 1994... Pois é, precisamos trazer à memória certos marcos indeléveis da caminhada da Igreja católica no Ceará, para percebermos – em incômoda e dolorosa comparação – o quanto a valorosa atuação da Pastoral Carcerária (e das demais Pastorais Sociais da Arquidiocese de Fortaleza) está, hoje, ‘por conta própria’, ou seja, funciona sem apoio estrutural nem incentivo moral por parte da liderança da Igreja local – e isso em um cenário de violência recrudescida e penitenciárias abarrotadas de presos!


Não é que os desafios tenham ficado no passado! Mas de lá para cá, as ‘prioridades’ dos planos pastorais da Igreja no Ceará vêm se multiplicando... o que sempre significa que, no fim das contas, não se prioriza coisa alguma... A “promoção humana”, claramente no centro da atenção e atuação do ‘Filho do homem’ (vítimas de fome e sede, descamisados, migrantes estrangeiros e refugiados, doentes e encarcerados de Mateus 25,31-46), parece ser entendida, no contexto eclesial de hoje, como uma espécie de “apêndice” ou “primo pobre” da “evangelização” (sacramentalismo, liturgismo, espiritualismo desencarnado).


Que diferença pode fazer, nisso tudo, um simples nome? O que a cidade de Fortaleza e o Ceará ganham com mais esse espaço com a marca “Dom Aloísio”? Uma objeção, ouvida com frequência, destila desdém: ‘Basta de saudosismo! Chega de olhar para trás! Os tempos mudaram, a Igreja teve que mudar também e se adaptar! Não falemos mais nisso!’ – Eu, porém, lhes digo: Se a gente se calar, “as pedras gritarão”!


A fé bíblico-cristã se apoia inteiramente sobre a memória incômoda, inquietante e perigosa do profeta de Nazaré que fez dos “últimos” da sociedade os “primeiros” de seu Reino. “A pedra que os construtores rejeitaram tornou-se a pedra angular” (Sl 118,22 // Mt 21,42). O nome “Dom Aloísio Lorscheider” representa, para a sociedade cearense, um cristianismo primordialmente voltado às realidades desafiadoras deste mundo, uma Igreja solidária, companheira, misericordiosa e libertadora que tem a coragem profética de descer aos “porões da humanidade” (C. Mesters) para ser, ali, um sinal vivo do amor de Deus que não se esquece de nenhuma daquelas “vidas perdidas”.


Oxalá tivéssemos, hoje, lideranças religiosas como ele e outros da sua geração episcopal! Não deixa de ser significativo ter vindo o reconhecimento mais generoso do legado de Dom Aloísio da sociedade civil, contrastando com o silêncio sepulcral das autoridades eclesiásticas de plantão... O tempora, o mores! – “Mas a Sabedoria é justificada por todos os seus filhos!” (Lc 7,35)


*É professor, teólogo e filósofo. Integras Comunidades Eclesiais de Base (CEB) de Fortaleza.