Por indicação do nosso leitor, Reinaldo Oliveira, reproduzimos o artigo da Senadora Ana Rita - PT/ES. Texto excelente, segue.
Por uma reforma política que
aprofunde a democracia
O projeto de
minirreforma eleitoral em discussão no Senado, pelo conteúdo, parece-me que
servirá para reforçar a velha máxima: "Mudar para continuar como
antes". Ao mesmo tempo do projeto de lei do Senado, diversas propostas
estão sendo apresentadas. Segundo os autores, objetivam reduzir gastos de
campanhas eleitorais, aumentar a transparência no processo e garantir igualdade
de condições aos candidatos em disputa.
É lamentável que estejamos nos
limitando à discussão do tamanho de adesivos, da proibição ou não de placas e
da pintura de muros em propriedades particulares, de regras para envelopamento
de carros e outros bens particulares móveis, ou mesmo — num aspecto importante,
mas insuficiente — com a diminuição do número de cabos eleitorais nas eleições.
Essas são apenas alterações periféricas, que não enfrentarão o atual quadro de
desigualdades a que estão submetidos os pleitos eleitorais.
Se essa minirreforma é uma
tentativa do parlamento de responder à voz das ruas, que clama por uma reforma
política profunda no Brasil, fica a impressão de que os questionamentos não
foram bem interpretados. Estou convencida de que a questão central do debate
apresentada pelas ruas diz respeito às distorções presentes no atual modelo de
representatividade, com peso gigantesco do setor econômico, presença
inexpressiva da diversidade social brasileira no parlamento, além da
insuficiência de mecanismos de participação social direta nas decisões
políticas do país.
Dados do Departamento
Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap) revelam a profunda distorção do
atual sistema político brasileiro. Dos 594 parlamentares eleitos em 2010, 273
são empresários (246 deputados e 27 senadores), 160 compõem a bancada ruralista
(142 deputados e 18 senadores), 73 são da bancada evangélica (três senadores e
70 deputados), e apenas 72 parlamentares (64 deputados e oito senadores) são
considerados representantes dos trabalhadores, da bancada sindical. A
sub-representação atinge também as mulheres, que representam apenas 9% dos 513
deputados e 12,3% num universo de 81 senadores. Isso, sem mencionar a presença
ínfima de negros, homossexuais, indígenas, ou mesmo de pobres no parlamento.
São questões apontadas há muito tempo por várias organizações populares e
amplificadas pelo movimento de junho a que, infelizmente, o perfil conservador
e elitista do parlamento brasileiro tem demonstrado incapacidade de responder.
A resistência que parte significativa dos congressistas tem demonstrado à
proposta de constituinte exclusiva e plebiscito demonstra a enorme dificuldade
de conviverem e conjugarem o exercício parlamentar com participação direta da
sociedade na construção da cidadania. Há uma dificuldade latente em romper com
os atuais entraves que limitam a nossa jovem democracia. Esse quadro revela que
medidas consistentes, capazes de corrigir as distorções presentes no atual
sistema político e eleitoral, dificilmente serão tomadas pelo Congresso
brasileiro, por uma razão muito simples: parte significativa dos parlamentares
são fruto e decorrência do atual modelo. Uma verdadeira reforma política deve
ser capaz de aprofundar a democracia e isso invariavelmente passa por tocar em
alguns pontos que são fundamentais nesse debate.
O primeiro deles é combater o
personalismo, fortalecendo as organizações partidárias assentadas em programas
e projetos de sociedade. É fundamental ampliar os mecanismos que possibilitem a
participação de seus filiados, aumentando a democracia interna e a
transparência na gestão de seus recursos.
Segundo, é o fim do
financiamento privado de campanhas eleitorais. Em nossa opinião, a porta de
entrada para a corrupção. Esse devia ser o ponto central de qualquer debate
sobre reformas do atual sistema político nacional. Os inúmeros casos de
corrupção apontam que o atual sistema produz o político corrupto em uma ponta,
e, na outra, o corruptor, ávido para receber benesses do Estado.
Terceiro, a adoção de lista
preordenada com paridade de gênero, o que possibilitará a ampliação da presença
das mulheres, um dos segmentos sociais hoje sub-representados no parlamento e
nos espaços de poder. Por fim, dados os limites já sabidos da atual composição
do Congresso Nacional em relação a esse tema, é imprescindível a convocação de
uma Assembleia Constituinte sobre a reforma política. A voz das ruas pediu uma
ampliação efetiva dos atuais limites da democracia e a minirreforma em
discussão não dá conta desses anseios. Isso só será possível a partir de
intensa participação da sociedade, quem de fato deve protagonizar as mudanças.
( 20/09/2013 Senadora Ana Rita
– PT/ES)
