Quando a ideologia tenta calar o palco… - Revista Camocim

segunda-feira, 15 de dezembro de 2025

Quando a ideologia tenta calar o palco…

 


O cantor Zezé Di Camargo usou as redes sociais na madrugada desta segunda-feira para anunciar que estaria pedindo ao SBT a retirada do seu especial de Natal do ar. O motivo: sua discordância com a presença de autoridades do atual e legítimo governo brasileiro na inauguração do canal SBT News. Entre os convidados estavam o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a primeira-dama Janja, o vice-presidente Geraldo Alckmin, o ministro Alexandre de Moraes, entre outros representantes institucionais.


Ao se declarar de direita, o artista afirmou repudiar a homenagem.


O que talvez ele não saiba — ou prefira ignorar — é que toda e qualquer concessão de televisão no Brasil está diretamente vinculada ao governo federal que a concede. Não existe, portanto, a menor possibilidade de um canal da importância do SBT inaugurar um braço jornalístico sem convidar a alta cúpula do governo vigente, independentemente de preferências ideológicas.


Isso não é opção política. É institucionalidade.


É Estado Democrático de Direito.


Alternâncias de poder fazem parte da democracia e precisam ser respeitadas, ainda que contrariem parte do eleitorado ou posições pessoais. Zezé tem, sim, todo o direito de se posicionar politicamente. Inclusive de discordar. Mas soa equivocado — e fora de contexto — tentar vincular sua participação artística a uma decisão institucional que cabe exclusivamente à emissora.


Há contratos, há compromissos comerciais e, sobretudo, há um público que espera respeito. A decisão final, evidentemente, cabe à direção do SBT, que certamente saberá conduzir a situação com equilíbrio e responsabilidade, como sempre fez ao longo de sua história.


Quanto às alegações de que a emissora estaria desrespeitando a vontade de Silvio Santos, isso não se sustenta. Eliakim Araújo e eu trabalhamos no SBT entre 1993 e 1997 e convivemos de perto com Silvio e sua equipe em um ambiente absolutamente democrático, plural e respeitoso com as instituições brasileiras. Nunca vimos Silvio Santos se alinhar publicamente a esta ou àquela ideologia partidária. Ele era um homem à frente do seu tempo, inovador, e profundamente consciente do papel social da comunicação.


Tenho convicção de que, se estivesse vivo, Silvio convidaria o atual governo para a inauguração do SBT News — assim como convidaria qualquer outro governo legitimamente eleito. Porque entendia que televisão é concessão pública, não palanque ideológico.


Lamento, portanto, que um artista com uma trajetória tão longa e relevante se deixe contaminar por uma leitura tão estreita da realidade. Antes de colocar interesses pessoais acima de tudo, talvez fosse importante lembrar que o artista existe para o público — e não o contrário.


Afinal, como diz Milton Nascimento nos Bailes da Vida. 


“ Todo artista precisa ir onde o povo está.” 


Assinado: Leila Cordeiro. jornalista