Em Camocim, quando a lei vira sugestão, o abuso vira rotina - Revista Camocim

segunda-feira, 21 de julho de 2025

Em Camocim, quando a lei vira sugestão, o abuso vira rotina



Em pleno século XXI, no país da Constituição Cidadã, um camocinense viveu mais uma vez o vexame de ter seus direitos jogados no chão como papel velho. Não é drama. Não é exagero. É só mais um capítulo da novela suja que se repete quando o serviço público esquece o que significa a palavra “respeito”.


A cena é de um roteiro indigesto: no LAMAC, uma mulher grávida ficou de pé, por tempo indeterminado, diante de profissionais que parecem ter esquecido que acolher também faz parte do trabalho. Foi preciso um outro cidadão intervir, com educação, aliás, para que alguém lembrasse que grávida tem prioridade. Mas não foi a equipe. Foi um anônimo. Um gesto bonito do ponto de vista humano; um vexame completo do ponto de vista institucional.


Só que o show de horrores não parou aí.


Durante o exame da esposa, uma ultrassonografia transvaginal, o marido foi impedido de entrar. Detalhe: ele apresentou a Lei 14.737/2023, que garante acompanhante para qualquer mulher em exames, consultas e procedimentos. A única exceção? Centro cirúrgico ou UTI, com justificativa técnica. O LAMAC não era nem uma coisa nem outra. Mas agiu como se fosse o STF da arrogância.


Como se já não bastasse violar a lei, a equipe resolveu inovar no vexame: impediram o homem de acompanhar a esposa sob a alegação de que ele não quis guardar o celular no bolso. Sério. Em 2025, portar um celular virou crime. Alegaram “medo de gravações”. Ora, quem tem medo de ser gravado normalmente tem medo de ser pego.


E antes que digam que foi um caso isolado: não foi. A médica responsável, segundo relatos, já tem histórico de agir com a delicadeza de um trator. Parece que o jaleco virou licença para atropelar direitos, pisar na lei e tratar paciente como incômodo.


O que mais revolta? A frase dita por uma funcionária: “aqui ninguém cumpre lei nenhuma”. Eis o retrato da falência ética do serviço público, quando se acostuma com a impunidade. É o escárnio virando norma. É o desrespeito sendo passado adiante, como quem passa o ponto do pastel.


E mais: o homem em questão não é nenhum arruaceiro. É pai de família, estudante de Direito no 9º período, defensor voluntário dos direitos humanos, ex-servidor comissionado e hoje desempregado. Sonha em trabalhar, sustentar os filhos, e ainda tem a ousadia de acreditar que política deveria servir à justiça social e não a essa eterna encenação de promessas vazias e empurrões de barriga.


Prometeram emprego. Prometeram nomeação. Prometeram dignidade. Entregaram silêncio, enrolação e um teatro cínico de “vamos ver”.


Esse caso não é só sobre saúde pública. É sobre o que acontece quando a lei vira sugestão, quando direitos viram favores, e quando médicos se acham donos dos corpos alheios. É sobre o que se perde quando política serve mais para prometer que para cumprir.


É preciso dizer em alto e bom som: ou vale o que está na lei, ou não vale mais nada. Quem cala, consente. E quem consente, sustenta essa estrutura podre que transforma cidadão em figurante e injustiça em rotina.


Que o Ministério Público, o CRM e a Ouvidoria do SUS não se escondam atrás do silêncio. Porque o silêncio, neste caso, é cumplicidade.


 A versão do LAMAC


Em resposta à denúncia de um camocinense que alegou ter seus direitos violados durante um atendimento no LAMAC, a coordenadora da unidade, Dona Conceição, se pronunciou sobre o ocorrido, garantindo que a instituição segue as normas legais e preza por um atendimento humanizado.


O episódio envolveu uma mulher grávida que, segundo o relato, teria sido ignorada por profissionais da saúde que não a atenderam de imediato, apesar da prioridade garantida por lei para gestantes. Além disso, o marido da paciente, ao tentar acompanhar o exame de ultrassonografia transvaginal de sua esposa, teria sido impedido de entrar no local, mesmo apresentando a Lei 14.737/2023, que assegura o direito de acompanhante para mulheres em consultas e procedimentos, com exceção somente para centros cirúrgicos e UTIs.


De acordo com Dona Conceição, a gestante não foi ignorada e recebeu o devido atendimento. A coordenadora explicou que o acompanhante da mulher que faria exame transvaginal não foi proibido de entrar. Ele teria sido orientado a guardar o celular, o que, segundo ela, foi uma medida necessária para evitar possíveis gravações do procedimento. O homem teria saído irritado e não permitiu que a sua esposa fizesse o exame. “Ele não guardou o celular, ficou alterado, médica e servidores ficaram nervosos e as demais gestantes que aguardavam atendimento”. 


A coordenadora ainda acrescentou que a equipe do LAMAC sempre busca agir com respeito e dentro das normas, e que o pedido para que o celular fosse guardado tinha como objetivo a proteção da privacidade dos envolvidos, paciente e profissionais.


“Aqui no LAMAC, trabalhamos com seriedade, respeito às leis e prezamos pela humanização do atendimento. A nossa orientação é sempre a de manter um ambiente seguro e digno para todos. Não houve qualquer tentativa de desrespeitar o direito da paciente, mas sim uma ação dentro das normas de segurança e preservação do sigilo médico”, explicou a Coordenadora Conceição.


Carlos Jardel

Carlos Jardel