Contam que, nas noites de verão, das grandes marés de lua, na praia do pontal do farol costuma aparecer um navio pirata fantasma, que ancora a poucos metros da praia, e baixando o escaler, traz à terra garboso capitão pirata e sua tripulação, mais ainda, uma arca repleta de joias e moedas de ouro. Um verdadeiro tesouro. Fruto de pilhagens em alto-mar. Chegando a terra, o jovem garboso capitão pirata, ordena que os tripulantes cavem um buraco na areia e enterrem o seu tesouro; depois voltam todos ao navio, que desaparece tão de súbito e misteriosamente, como apareceu.
Superstições a parte. Estórias de pescador. Estórias de trancoso. Quem sabe! Eu mesmo nunca vi.
Porém, poucos quilômetros a frente, no mesmo litoral, a paradisíaca praia das Caraúbas também tem estórias. Não de fantasmas. Mas sim, a história do ermitão – Caburé -
Ali, na imensidão daquela deserta e bela praia, o eremita Caburé fez sua morada. Não se sabe de onde veio. Para abrigar-se, alguma estacas fincadas na areia, e um roto pedaço de lona, formavam uma espécie de barraca. Uma trempe, - três pedras - era seu fogão. Lenha como combustível. Uma lata, servia-lhe de panela. Uma lamparina para as noites escuras sem lua. Uma esteira imunda era sua cama, ao mesmo tempo fazia as vezes de mesa, durante o dia. Roupa, só a do corpo, andrajosa e rasgada. Sua alimentação consistia basicamente de pescado. Possuía uma pequena e surrada tarrafa, e vários quilômetros de oceano a sua frente, todo seu. Quando a maré estava cheia - alta - pescava peixes, camarões, etc... quando secava - baixa - colhia búzios, mexilhões, e lagostins, entre as pedras - arrecifes -
A praia das Caraúbas, dista da sede - Camocim - mais ou menos oito quilômetros. Raramente Caburé vinha a cidade, só mesmo quando em extrema necessidade, e para voltar logo. O percurso era feito a pé.
Gostava mesmo era do seu paraíso. Da imensidão do oceano, do cheiro de maresia, do sol abrasador, dos pingos da chuva, das noites de lua, quando a maré alta cobria as dunas de areia, com sua espuma de prata chega doía na vista. Gostava do seu catre, pois ali nada faltava. A mãe natureza provia-lhe o básico necessário à sua sobrevivência.
Na época não havia estrada, o acesso aquele local era difícil, só de jeep - tração - ou a pé. Por isso eram raras as visitas, embora Caburé, sempre as recebesse amistosamente. Só não era de falar muito. Perguntas respondia sempre com monólogos, tipo: Sim! Não! Sim senhor! Tá certo! Não sei!
As pessoas as vezes deixavam-lhes roupas, comida, um trocado. Não que pedisse, mesmo assim, agradecia: – Brigado! Deus lhe pague!
Assim viveu o eremita Caburé. Dono do mar, das dunas, da praia. Senhor da natureza. Não tinha horário, nem patrão. Não pagava imposto. Nem mesmo, tinha uma companheira. Bastava-lhe a amiga natureza. O dia e a noite, o vento, o sol, a lua.
Um certo dia foi encontrado morto nas dunas, próximo a sua barraca. Aparentava está dormindo, pois tinha no semblante, a placidez daqueles que partem com a consciência em paz. Partiu de um paraíso para outro.
A exemplo do Garboso Capitão Pirata, que nas noites de lua visita o pontal do farol, quem sabe, se o fantasma de Caburé, também numa destas noites, não virá a sua praia, - Caraúbas - para matar saudades. E se um dia for visto por alguém que tenha a coragem para interpelá-lo com a seguinte pergunta. Com certeza, ouvirá a seguinte resposta:
- Por que partistes Caburé? Ó eremita sonhador! Deixando cá na terra, este paraíso ao léu?
- Parti tão somente, meu senhor! Porque Deus me arranjou. Outro paraíso no céu!
Inácio Santos