Particularmente, não percebo a relevância da premiação de uma arte essencialmente industrial, orientada principalmente por critérios outros que não os estéticos. Também não levo com seriedade a ‘'consciência política’' de atores, cuja imagem pública é inteiramente fabricada pela indústria de que são operários. Mas concedo a Leonardo di Caprio o benefício da dúvida ao reconhecer a importância do tema que aborda e a verdade do que diz.
Ele finalmente venceu o Oscar, ainda que eu preferia ter visto ele vencendo pelo filme “O Lobo de Wall Street” do que em “O Regresso”; mas já dizia nossa gloriosa Glória Pires na hora que ele venceu: “ufa, puxa...”. Em todo caso esse texto não se refere à atuação dele. Quero me referir à estrutura de que ele faz parte e, claro, ao Oscar.
O cinema hollywoodiano é industrial, o que não significa que não possa produzir arte, mas não o faz como propósito. Há artistas que não obedecem a demandas externas e comerciais, e sim existem critérios estéticos independentes de critérios econômicos. Óbvio.
Então, tentando explicar ponto por ponto: "Que tipo de arte não está relacionada a alguma indústria?" Indiretamente, talvez nenhuma. Diretamente, isto é, como modo de produção, várias: a dança, as artes plásticas, a literatura, o teatro, o cinema, entre outras.
Atuar é uma arte. E como já digitei antes não me referia à atuação do Leonardo di Caprio ou à atuação em si, mas à distância que existe entre a imagem pública do ator e sua individualidade. Queria dizer que, ainda que esse discurso (dado por ele na entrega do último dia 28), não represente um ponto de vista verdadeiro, por hipótese, mas construído para forjar ou fortalecer uma imagem, tem valor em si mesmo. Contudo voltando: atuar é, por excelência, arte. Portanto, é uma atividade de caráter estético, que se orienta por critérios estéticos. Somente estéticos, por princípio.
De todo modo, minha observação não anseia essa direção, mas outra: ainda que nossa sociedade se organize em torno da produção de valores de uso, consumo, troca etc., a arte, que tem um valor em si, perde-se quando o que é feito o é conforme o gosto do cliente. Nesse caso, a arte transforma-se em mercadoria e os critérios estéticos próprios e internos à obra, se não desaparecem inteiramente, sujeitam-se a interesses econômicos.
Daí minha desconfiança em relação a uma premiação como o Oscar, que premia, sobretudo, a si mesma. Ou como explicar a derrota de Meryl Streep, Cate Blanchet e Fernanda Montenegro em 1999 para a atuação insípida e sem graça de Gwyneth Paltrow na categoria de interpretação feminina? Ou como entender que Edward Norton e Tom Hanks foram derrotados no mesmo ano pelo palhaço sem graça do Roberto Benigni na interpretação masculina? Ora, naquele momento premiar esses nomes era com certeza mais rentável; e como o tempo é grande e onisciente, pergunto: O que Gwyneth e Roberto Benigni fizeram de relevante depois disso? A mesma indústria que os premiou os esqueceu.
A indústria existe, e ainda assim há cinema de arte, não se pode negar. Um não elimina o outro. O meu comentário desde o início é sobre a influência do caráter industrial do cinema sobre aquilo que produz. Essa influência existe, mas não elimina a possibilidade de que alguns filmes sejam realmente artísticos. Se não fosse a indústria do cinema filmes como Mad Max, Distrito 9 e Bastardos Inglórios dificilmente existiriam.
A última Gargalhada, de Murnau, é o melhor exemplo do que a indústria quer e de como um grande cineasta consegue, ao mesmo tempo, atender à demanda e preservar sua arte. O final arranjado do alto é, ao mesmo tempo, o final feliz incompatível com a história e a última gargalhada do diretor: ironia pura.
Apenas sei que além disso eu “não sou capaz de opinar”.