QUE HORAS ELA VOLTA? - Revista Camocim

segunda-feira, 21 de setembro de 2015

QUE HORAS ELA VOLTA?

Por Júnior Santiago

Poucos filmes ultimamente me têm feito refletir tanto como o último filme estrelado pela Regina Casé, chamado: Que Horas Ela Volta? Uma crônica, sutil, delicada e ao mesmo tempo feroz a tudo aquilo que chamamos de vida “normal”. E sem meios termos, porém com muita elegância e competência expõe algo tão corriqueiro que passa despercebido em nós: a relação entre patrão e funcionário.

A história é de uma nordestina chamada Val (Regina Casé) que deixa a filha em Pernambuco e vai morar em São Paulo como doméstica na casa de uma família rica. Val cuida da comida, da limpeza da casa, do filho dos patrões. Considerada como “praticamente da família”. A família que tem um pai omisso, uma mãe controladora e um filho que passa mais tempo com a funcionária do que com os pais. Enfim, seria esse o retrato da família tradicional brasileira? 

No entanto, acontece uma pequena revolução naquele modelo “perfeito” de se viver. A filha de Val, Jéssica (Camila Márdila), decide sair de Pernambuco para fazer o vestibular em São Paulo; Val teve pouco contato com a filha e o seu carinho de mãe foi entregue a Fabinho (Michel Joelsas), o filho da família, a ponto de ele ter ela como ponto de referência em termos de carinho, autoridade e respeito. Algo que a própria mãe não tem do filho.

A priori Jéssica dividiria o “quartinho de empregada” com a mãe até fazer a prova do vestibular. Aqui, acontece sutilmente a grande questão do filme. As fronteiras entre Val e a família são abaladas com a chegada de quem não conhece esse tipo de fronteira. No mais, não posso nem quero revelar como o filme se desenrola e termina; mas, apenas declaro que fiquei feliz com o final. Ou melhor, posso explicitar que fiquei muito feliz com o filme como um todo. Percebi uma história coerente, coesa e sem os apelos emocionais e soluções simplórias.

Antes mesmo de estrear no Brasil, o filme da diretora e roteirista Anna Muylaert já vem colecionando prêmios em festivais importantes de cinema pelo mundo, como em Berlim e Sundance. No caso do festival de Sundance uma curiosidade, lá não existe premiação para as interpretações, mas os organizadores do festival ficaram tão impressionados com a veracidade com que Regina Casé fez seu personagem que foi criado o prêmio de melhor atriz para dar a ela. Hoje o filme é o pré-indicado brasileiro a tentar uma vaga na disputa do Oscar 2016 e mesmo sabendo que Oscar é uma ilusão, garanto que dizer isso dá certo ibope para os desinformados de plantão que precisam de um “selo estrangeiro de bom gosto” para poder dizer se gostam ou não de alguma coisa. 

Contudo o grande prêmio dessa história muito bem amarrada é a reflexão que ela sucinta em nós; fiquei um bom tempo refletindo acerca das questões levantadas ao longo de uma hora e meia que os fatos são desenrolados. Quer uma reflexão? Então te falo: Que Horas Ela Volta?

Júnior Santiago é camocinense, Graduado em filosofia chancelado pela UFG e atualmente faz teologia na PUC Minas Gerais. Congregação São Pedro Ad Víncula