O PASSADO QUE NÃO SERVE MAIS - Revista Camocim

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terça-feira, 1 de setembro de 2015

O PASSADO QUE NÃO SERVE MAIS


Por Júnior Santiago

Depois de ver alguns jovens, que não conhecem a história do Brasil, pedirem (em alguma coisa que ousam chamar de “protesto”) que aconteça intervenção militar novamente no país; eu gostaria de relembrar umas coisas que aprendi na escola sobre o regime militar. 

A Ditadura Militar durou oficialmente entre os anos de 1964 a 1984; nesse período surgiu no Brasil o desejo de defender aquilo que de mais precioso o gênero humano tem: liberdade de expressão. Esse foi um momento em que a produção cultural e artística brasileira teve grande apogeu de criações. Em tempos de crise surgem grandes soluções. Havia efervescência na música, literatura, artes plásticas, cinema, teatro etc.

Os militares responderam do modo que sabem: na repressão, na força bruta. Livros foram queimados, teatros invadidos, atores agredidos, pessoas exiladas com medo da morte, músicas censuradas, jornais e filmes proibidos de serem lidos. A censura era implacável, atingiu inclusive obras clássicas da cultura mundial.

E não ficava “apenas” na proibição, na repressão. Estudantes universitários eram espancados no meio da rua, as aulas de filosofia proibidas, muitas prisões arbitrárias aconteceram, torturas aos presos políticos, pessoas desapareciam repentinamente. Ninguém estava salvo, qualquer um poderia ser preso político: artistas, jornalistas, padres, estudantes, donas de casa etc.

Houve várias reações contra esse regime totalitário que o Brasil vivenciava. Alguns de maneira mais ou menos “sutil” como: Chico Buarque, Milton Nascimento, Belchior. Outros mais debochados e sarcásticos assim surgem: o “Tropicalismo” (Caetano Veloso, Gilberto Gil, Gal Costa, Maria Bethânia, Tom Zé) e o grupo Dzi Croquetes (homens que tinham um espetáculo musical onde se vestiam de mulher, cantavam, dançavam); outros de modo direto e explícito como o movimento MR8 (Movimento Revolucionário 8 de Outubro), que sequestrou o embaixador americano Charles Burke em setembro de 1969. O caso ganhou notoriedade mundial. 

A primeira vez na história que um embaixador era sequestrado. O preço do resgate era a liberdade de presos políticos. Mais explícito que isso não tem como imaginar; inclusive o episódio virou livro e mais tarde o filme: “O Que é Isso Companheiro?”. O filme chegou a disputar o Oscar no ano de 1998.

Por falar em cinema. Este era usado para mostrar a realidade contida no Brasil; o movimento Cinema Novo cujo lema era: “uma câmera na mão e uma ideia na cabeça”; foi o maior responsável por isso. Os filmes eram feitos com orçamento irrisório e por vezes lançados primeiro fora do país onde disputavam festivais de cinema ao redor do mundo como de Cannes, Veneza, Berlim. Enquanto isso, no país era liberado apenas filmes de pornochanchadas, comédias ou filmes que “aparentemente” não eram contra o governo dos militares. Desse período temos Glauber Rocha um dos mais importantes e respeitados cineastas de todos os tempos, são dele filmes como: Deus e o Diabo na Terra do Sol, Terra em Transe, O Santo Guerreiro Contra o Dragão da Maldade.

Já na televisão novelas como “Roque Santeiro” recebia censura por ser considerada subversiva; porém outras como “O Bem Amado”, “O Rebu”, “O Espigão” conseguiram furar o bloqueio e sutilmente deram seu recado à população; resta saber se todos na época entenderam. Na televisão também cresciam os festivais de música brasileira. 

Foram estes os responsáveis pelos maiores recados que os artistas deram ao povo brasileiro. A mais famosa com certeza foi: “Caminhando ou pra não dizer que não falei das flores” de Geraldo Vandré, o refrão sintetizava o desejo do coração de liberdade contido no país: “Vem vamos embora que esperar não é saber, quem sabe faz a hora não espera acontecer”. Lançada em setembro de 1968.

Meses antes, em 28 de março de 1968 morria: Edson Luís de Lima Souto, estudante. Primeira morte que a ditadura não conseguiu esconder. A comoção tomou conta dos grandes centros; a igreja que foi realizada a missa de sétimo dia foi cercada; e o saldo disso dezenas de feridos. O Brasil não poderia mais ficar de braços cruzados. Militares muito menos; então acontece o AI5: ato institucional n°5, que restringia os direitos do povo e ampliava os dos militares e do presidente, na época Artur Costa e Silva. 

Pouco depois a estilista mineira Zuzu Angel tem seu filho: Stuart Edgard (integrante do MR8) preso e barbaramente assassinado. Os anjos que era a característica de seus modelos e croquis davam lugar a desenhos de armas costuradas nas roupas; um modo de protesto contra a morte de seu filho cujo corpo não havia aparecido. A partir de então Zuzu Angel torna-se mais uma militante contra os militares. E constantemente ameaçada, Zuzu Angel é morta em 1976. Seu carro cai de uma altura de 5 metros, morre instantaneamente. 

Outro que morre é o cearense Frei Tito (da congregação dos dominicanos) preso pela ditadura. Torturado e exilado; depois de sofrer distúrbios psicológicos devido às torturas torna-se mais uma vítima do regime totalitário. Esses são exemplos de pessoas que ganharem notoriedade, mas os que morreram anonimamente? Muitos estão desaparecidos até os dias de hoje.

Depois de tudo isso. Ouso perguntar àqueles que chegaram até o final desse escrito: quem deseja que a ditadura volte e a intervenção militar aconteça novamente? Querem realmente acabar com as conquistas duramente conquistadas? 

Eu prefiro lutar por melhorias e não por retrocessos. E sobre esse passado já dizia Belchior: “é uma roupa que não nos serve mais”.

Júnior Santiago é camocinense, graduado em filosofia chancelado pela UFG e atualmente faz teologia na PUC Minas Gerais. Congregação São Pedro Ad Víncula.