Sábado Santo: A Vida triunfou! - Revista Camocim

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sábado, 3 de abril de 2021

Sábado Santo: A Vida triunfou!

 


* Por Paulo Clesson


O evangelho proclamado na liturgia do Sábado Santo deste ano é extraído de Marcos 16,1-7, que narra a história de um túmulo vazio, outrora ocupado pelo corpo de um crucificado, Jesus de Nazaré.


A narrativa se inicia com algumas mulheres se dirigindo ao túmulo de Jesus no alvorecer do domingo, Maria Madalena, Maria mãe de Tiago e Salomé. Essas mulheres foram testemunhas da vida de Jesus (Mc 15,41), da morte de Jesus (Mc 15,40) e do seu sepultamento (Mc 15,47). Eram suas seguidoras, discípulas, algo inusitado para aquela época, tendo em vista que os rabinos tradicionais não aceitavam mulheres como discípulas, às mulheres cabia o trabalho privado do lar e da geração e cuidado da prole. Elas estavam classificadas entre os pequenos da sociedade judaica, no decálogo, dez mandamentos, inclusive, a mulher está entre os pertences do patriarca da família (Ex 20,17), ou seja, era propriedade do chefe do clã da mesma forma que um escravo, animal ou objeto. A voz feminina não era ouvida nem nos tribunais, seu testemunho não era válido. Jesus foi ousado em aceitar discípulas e contrariar esse tipo de machismo institucional.


De acordo com Marcos, as discípulas de Jesus vão até a sepultura para concluir os rituais fúnebres de preparação do corpo, o mestre que elas tanto amavam tinha sido injustiçado tendo a vida ceifada por instituições promovedoras de morte e não comprometidas com a vida. O túmulo daquele profeta soava como um aviso de advertência para quem ousasse desafiar aquele sistema cruel. A Pedra do túmulo era a mordaça definitiva na boca do servo sofredor.


No caminho até a necrópole as discípulas se preocupavam em quem removeria a pedra que fechava o sepulcro, elas não tinham força para fazê-lo sozinhas. Ao chegarem ao local, para a surpresa delas, a pedra havia sido removida, quem teria feito aquilo e por que? Entrando no local elas encontram um jovem vestido de branco que diz: 


“Não vos assusteis! Vós procurais Jesus de Nazaré, que foi crucificado? Ele ressuscitou. Não está aqui. Vede o lugar onde o puseram. Ide, dizei a seus discípulos e a Pedro que ele irá à vossa frente, na Galileia. Lá vós o vereis, como ele mesmo tinha dito”. (Mc 16,6-7)


O jovem começa falando da superação do medo, sentimento que afastara os discípulos homens do caminho tortuoso de Jesus, pois todos fugiram na hora decisiva, medo que os mantinham escondidos, receosos da prisão por cumplicidade com um condenado. O medo é uma realidade humana compreensível, natural, mas não pode ser uma prisão que nos imobiliza e até distorce a realidade, pelo medo nós também matamos. Em seguida o jovem pergunta o motivo da visita, que é Jesus, lógico, mas o homem que elas viram na cruz não está mais entre os mortos, diz o jovem; voltou a viver, o túmulo está vazio. As discípulas tinham vindo encontrar um cadáver, sinal da vitória da morte, do fracasso de Jesus, mas encontraram uma tumba que nada guardava, a vida teve a última palavra. São as mulheres, portanto, discípulas consideradas de menor importância, mas perfeitas aprendizes do ensinamento do Lava Pés da Quinta-feira Santa, e fiéis seguidoras do mestre na vida e na morte, as primeiras testemunhas e anunciadoras da ressurreição. 


As mulheres ainda recebem do jovem o mandato de anunciar aos outros discípulos a boa notícia, Jesus vive, e que eles devem voltar a Galileia para se encontrarem com Jesus pessoalmente. É um convite para voltar onde tudo começou no evangelho de Marcos, na Galileia, periferia de Israel, terra de pobres e marginalizados. É lá, no meio dos excluídos, que o ressuscitado os espera, “lá vós o vereis”. O convite para o retorno a Galileia mostra que o cristão não deve ficar com os olhos fixos na eternidade se esquecendo de viver o aqui e agora, é preciso lembrar o que Jesus ensinou e viver do jeito que ele viveu, somente assim, na caminhada com Jesus, o discípulo consegue compreender quem é o ressuscitado e o significado profundo de uma vida regida pelo amor a Deus e ao próximo. Para Marcos, Jesus não é um conceito, mas uma experiência.


A pedra removida e o túmulo vazio, representam a vitória de um anseio muito profundo do ser humano: não queremos morrer. A vida, com todas suas dificuldades e dores, também é uma realidade de alegria e felicidade, que só não é melhor porque nosso comportamento, muitas vezes marcado pelo egoísmo, gera as situações de trevas da nossa história. Nossa sede é por vida, viver bem e viver mais, viver plenamente. Esse é um desejo que vai para além do tempo histórico (cronos) e que, para os cristãos mergulha no tempo Deus (Kairós), realidade inaugurada pela ressureição de Jesus que, enquanto no cronos, viveu pelo amor e o testemunhou e agora, no kairós, vive no amor em sua total plenitude.


Para nós, viventes dessa realidade, o evangelho da liturgia de hoje mostra que vale a pena “amar como Jesus amou, pensar como Jesus pensou, sonhar como Jesus sonhou, viver como Jesus viveu, sentir o que Jesus sentia, sorrir como Jesus sorria”, como poetizou Padre Zezinho. Essa atmosfera, na qual viveu Jesus, terminou em ressurreição, em vida. Que o sábado Santo fortaleça nos cristãos o desejo de defesa da vida, e de boa vida para todos, na esperança de que, no amor, a vida se eternize. O ressuscitado vive entre nós.


*Paulo Clesson é Professor de História e Especialista em Biblia