
Era grande a curiosidade para saber no que
resultaria o mais improvável encontro deste Rock in Rio, o do Sepultura com o
cantor Zé Ramalho. E o que se viu na noite deste domingo (22) foi uma simbiose
perfeita, num show que não apenas entra para a história do festival, mas tem
tudo para virar disco, inclusive o nome, dado pelo público: Zépultura.
Antes mesmo do início do show,
a plateia que lotava o palco Sunset já gritava não apenas o nome da banda, mas
também o do cantor paraibano, mostrando que havia uma predisposição positiva
para o encontro. Daí para juntar os dois nomes foi um passo.
O cantor paraibano é
provavelmente a estrela da MPB mais benquista pelos roqueiros --seu estilo
místico-profético-apocalíptico, incluindo o visual todo preto e a voz cavernosa,
ressoa fundo na alma dos "headbangers". Uma cena resume: o mesmo
público que pouco antes quebrava tudo numa roda ao som de
"Innerself", do Sepultura, pediu espontaneamente para que Ramalho
cantasse "Avohai", um de seus maiores sucessos (infelizmente, não foi
atendido).
O Sepultura entrou em cena
primeiro e, com um repertório veloz e brutal --com pedradas como
"Innerself" e "Propaganda"--, deixou o público ouriçado. A
banda mostrou ainda canções nunca antes tocadas ao vivo (como "The
Hunt") e uma versão de "Da Lama ao Caos", de Chico Science, com
Andreas Kisser no vocal --segundo o guitarrista, a música estará no próximo
álbum do Sepultura.
Na metade do show, Zé Ramalho
foi chamado ao palco e chegou sob muitos aplausos. "É uma grande honra, um
grande privilégio dividir o palco com essa lenda, esse monstro da música
brasileira", disse Kisser, para delírio do público.
O convidado devolveu a
gentileza. "Prazer imenso estar dividindo o palco com uma banda poderosa
como o Sepultura, nessa noite linda do metal", disse, antes de cantar
"A Dança das Borboletas", música de seu repertório que ele já havia
gravado com a banda antes, em boa versão para a trilha sonora do filme
"Lisbela e o Prisioneiro".
Um toque de ousadia
bem-sucedida veio na ótima versão para "Mote das Amplidões", que
ganhou peso e velocidade sem perder suas raízes nordestinas.
Corajoso, Zé Ramalho não se
acomodou em seu repertório: cantou "Em Busca do Ouro", do disco solo
de Kisser, e em outro dos pontos altos do show, deu voz à rápida
"Ratamahata", uma das boas canções do disco "Roots", do
Sepultura.
O ápice estava reservado para
o final, com uma versão matadora de "Admirável Gado Novo", cantada em
coro pela plateia e com a parte final executada em ritmo extremamente veloz. Um
sucesso de deixar o público pedindo "mais uma".
Se em outros Rock in Rio a escalação
de artistas de MPB num dia de heavy metal se mostrou desastrosa, com gente
sendo expulsa do palco pelo público, a reunião de Sepultura e Zé Remalho
mostrou que, em alguns casos, a solução não é afastar os gêneros, mas uni-los
ainda mais.